quinta-feira, 1 de julho de 2010

Reflexão




Faz tempo que me intriga o pouco espaço dado pela mídia às questões do mar. Ainda que o tema seja meio ambiente, cuja demanda não pára de crescer, a situação persiste. Preste atenção e constate: para cada dez matérias, oito, ou nove, abordam questões relativas aos continentes. Por que que os oceanos são tratados como algo menor, apesar de sua vital importância, e sabendo-se que ocupam 71% da superfície da Terra?


Como é possível um tratamento secundário, e superficial, ao ecossistema que gerou vida no planeta? Desde os primórdios os oceanos nos dão comida e trabalho, mas isto é periferia comparado a outros benefícios. Os cientistas sabem que a gigantesca massa dágua presta serviços essenciais à vida. Até mesmo o ar que respiramos é obra deles: 80% do oxigênio da atmosfera é produzido durante o processo de fotossíntese experimentado pelas algas do fitoplacton.


Apesar das mudanças climáticas estarem nas manchetes, quase todos os dias, é raro achar matérias que expliquem como os oceanos regulam o clima, e contribuem para amenizar o aquecimento global ao sequestrar o dióxido de carbono da atmosfera (o gás causador do efeito estufa que promove o aquecimento global), depositando-o no fundo do mar. Os mares ainda fornecem energia e lazer. São via de ligação entre os continentes, e vitais para o comércio entre as nações. Promovem o turismo e diversos esportes. E nos dão algumas das mais belas paisagens (que destruímos sem piedade) com suas praias, falésias, dunas e baías.


Por que, então, o descaso? Pergunta difícil que comporta hipóteses. Uma delas talvez esteja relacionada ao conhecimento insuficiente deste corpo dágua. Até hoje o homem explorou menos de 2% do fundo dos oceanos.


Dificuldades técnicas agravam a questão: é complexo e caro explorar esta imensidão submarina. Mas também era caro, e ainda mais difícil, explorar o espaço sideral. Entretanto, instigado pela Guerra Fria, o gênio humano não se apequenou: colocou o homem na Lua, e se prepara, agora, para levá-lo à Marte.


Então, o que acontece com o mar?


Arrisco sugerir algumas pistas, entre elas, a diluição da propriedade. Os oceanos pertencem à todos, são um bem coletivo, um patrimônio da humanidade, e um reflexo de seus paradoxos e contradições.


Nos fóruns internacionais, é fácil culpar um determinado país, por não zelar por seus recursos naturais. Mas, como culpar a todos, pelo descaso com relação aos oceanos? Quem pressionará quem?


A verdade é que mal temos conseguido cuidar de nossa própria casa, os continentes. Que diria dos mares, que são o quintal?


Transformamos os oceanos numa espécie de “depósito-sem-dono”, de onde tiramos recursos naturais de forma ininterrupta e indiscriminada. E não há força capaz de frear tal comportamento, mesmo com os alertas dramáticos da comunidade científica. Os especialistas têm sido enfáticos em seus prognósticos. O colapso está próximo. A falência do sistema se avizinha.


De acordo com estas informações (publicadas por um grupo de cientistas na Revista Nature), 50% dos recursos de pesca estão toalmente esgotados, e 25% submetidos a exploração excessiva. Restam poucos bancos de pesca ainda não sobreexplorados. Para estes especialistas, a pesca industrial acaba em 2048.


Mas o ser humano não se contenta só em retirar. Diariamente despejamos nos oceanos milhares de litros de esgotos não tratados (dois milhões de toneladas por dia), além de quantidades assombrosas, e ainda não mensuradas, de agrotoxicos, defensivos agrícolas, óleo, e toda espécie de lixo imaginado.


O resultado é que estamos acabando com a vida marinha antes mesmo de conhecê-la melhor. Mas, muito pior que isto, é a ignorância. Só ela para justificar a apatia da opinião pública que não reage, ou reage pouco, às questões marítimas. Não é por outro motivo que cerca de 30% do espaço continental (mundial) está protegido por alguma forma de unidade de conservação, enquanto nos mares a área equivalente não ultrapassa 1%!


Por isto surgiu este blog. Seja gerando conteúdo inédito, através de minhas viagens, seja entrevistando especilistas, ou recolhendo informações na mídia, procurando ampliá-las e repercutí-las, este espaço se compromete com o mar, a zona costeira, e suas multiplas e variadas questões.


Por João Lara Mesquita, músico, fotógrafo e jornalista - http://www.marsemfim.com.br/

Um comentário:

  1. Na praia esse find, olhando o mar lembrei desse texto.E de certa forma foi um olhar diferente, junto com o olhar amoroso, de encantamento e respeito veio um olhar mais reativo aos fatos e dados expostos no texto.
    Nós os amantes do mar agradecemos o alerta e a iniciativa!

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